sexta-feira, 28 de maio de 2010

Ficha Limpa

Com o slogan “Voto não tem preço, tem consequencias”, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral iniciou em 2008 uma campanha visando aumentar o rigor da lei em favor de eleições mais limpas. A campanha consistiu, num primeiro momento, na coleta de assinaturas em número necessário para um projeto de lei de iniciativa popular. Este projeto de lei previa que aquelas pessoas que foram condenadas ou tiveram denúncia recebida por um tribunal devido a fatos graves, como racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas não poderiam se candidatar às eleições. Integrariam o rol dos inelegíveis também aqueles que renunciaram ao cargo para evitar processo por quebra de decoro parlamentar ou desrespeito à Constituição, bem como os que foram condenados em representações por compra de votos ou uso eleitoral da máquina administrativa.
Pois bem, a Câmara dos Deputados já havia aprovado e o Senado aprovou, no último dia 19, o projeto de lei que estabelece casos de inelegibilidade. Falta agora o Presidente da República sancionar a lei, para que ela possa valer já nas eleições deste ano. Outra questão abordada são os prazos para a inelegibilidade após as infrações. Pela lei atual varia de acordo com o tipo de infração e quem cometeu. Por exemplo, para deputados e senadores era de oito anos, para governadores e prefeitos, três anos. Pela nova lei passa a ser oito anos, após o mandato, independente do crime e de quem cometeu. Também com a nova lei, não é mais necessário o trânsito em julgado (quando não há mais chances de recurso), basta a decisão de um colegiado (grupo de juízes), em segunda instância, para o político ficar inelegível.
Dito isso, penso que todos os cidadãos brasileiros devam estar, no mínimo, satisfeitos com o resultado da votação. Trata-se de uma questão de princípios. É importante considerar o histórico do candidato, afinal ele fará parte e poderá influenciar, num futuro próximo, a vida de todos nós. Se a lei entrar em vigor e for cumprida à risca poderá mudar, aos poucos, o cenário político brasileiro. Enquanto isso, o eleitor que se sentia desmotivado ou decepcionado vislumbra uma luz no fim do túnel, pois poderá optar entre candidatos realmente comprometidos com a cidadania.

sábado, 22 de maio de 2010

Certidões de vida

Trabalhei durante muitos anos num Cartório. Para ser mais precisa, por catorze anos no Tabelionato de Sapiranga. Foi onde peguei gosto pelo Direito. Foi também onde aprendi muitas coisas e dentre elas a analisar e observar documentos que, diariamente, passavam por minhas mãos. Documentos de todos os tipos, como certidões, carteiras de identidade, passaportes, títulos de eleitores, enfim, de tudo um pouco.
Desde aquela época, quando pego algum desses “papéis”, costumo examiná-lo detidamente, verificando datas, nomes, lugares, profissão, endereços. Ficava imaginando de que maneira o papel refletia a vida da pessoa que era sua dona. Hoje, não posso negar, ainda tenho esse hábito. Então, me coloco como uma espécie de espectadora à distância do evento documentado, imaginando os detalhes e pormenores e montando uma espécie de quebra cabeças mental.
Uma certidão de casamento, por exemplo, pode levantar indagações assim: como teria sido o dia do casamento? Estava frio, quente, ensolarado ou chovia? Talvez fosse primavera... E como era o vestido da noiva? O local tinha flores? Música? Imagino o nível de felicidade dos noivos. Trocaram olhares? O que sentiram, o que estariam esperando da vida, depois daquele momento? Seus sonhos se concretizaram? Continuaram exercendo a profissão que consta na certidão? Será que ainda compartilham o mesmo ideal? Para onde a vida os conduziu? Tiveram filhos, será? Se a certidão é de nascimento, bom começar pela hora do parto. Depois ver o dia, mês e ano do nascimento, o nome e profissão dos pais, quem são os avós. E aí, em que momento da vida dessas pessoas esta criança chegou? Foi desejada, esperada e amada? Teve boa saúde? Quem é hoje e como será amanhã? O que acontecia no mundo, naquele exato dia? De uma certidão de óbito surgem questões peculiares. Verificando a hora em que ocorreu o falecimento, é de se perguntar se alguém esteve junto com a pessoa nesse momento? Qual teria sido seu último pensamento? Faltou algo a ser feito? Algum desejo ou sonho não realizado? Sofreu ou despediu-se da vida serenamente? O que significou a perda desta pessoa para os que ficaram?
Quantas histórias podem estar contidas num simples pedaço de papel, cheio de dados informativos... Claro que muitas destas perguntas ficam sem resposta mesmo, apenas na base da imaginação. Muitos documentos se apresentam bem amarelados, denotando que as histórias dessas vidas já aconteceram há muito tempo. Alguns, parece que estiveram na guerra (dos farrapos...) de tão destruídos que estão. Outros são mais recentes, histórias ainda acontecendo. Tem os bem conservados, a demonstrar o valor que representam.
De tudo isso se percebe que não importa a idade dos papéis, as perguntas podem ser atuais. E podem ser formuladas a nós mesmos, enquanto também personagens de nossa própria história, ainda em tempo de ser vivida ou modificada.
A História da humanidade, afinal, é assim também, feita de documentos. Por isso sua importância. Na verdade, os documentos falam... É preciso, apenas, entendê-los.

sábado, 15 de maio de 2010

"O caminho da vida pode ser o da liberdade e da
beleza, porém, desviamo-nos dele.
A cobiça envenenou a alma dos homens, levantou
no mundo as muralhas do ódio e tem-nos feito marchar
a passo de ganso para a miséria e os morticínios.
Criamos a época da produção veloz, mas nos
sentimos enclausurados dentro dela.
A máquina, que produz em grande escala,
tem provocado a escassez.
Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa
inteligência, empedernidos e cruéis.
Pensamos em demasia e sentimos bem pouco.
Mais do que máquinas, precisamos de
humanidade; mais do que de inteligência, precisamos de
afeição e doçura!
Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo estará perdido."

(Charles Chaplin, em discurso proferido no final do filme O grande ditador.)

Dondocas não... Guerreiras!!!

Dia desses fiquei chateada com uma coisa. Cheguei esbaforida e atrasada, como sempre, à reunião mensal da Liga Feminina de Combate ao Câncer de Sapiranga e peguei a conversa pela metade. Estavam contando o que a filha de uma das voluntárias relatou. Que em aula, um professor seu dissera que na Liga só iam “dondocas” ou mulheres que não tinham o que fazer. Isto provocou mais do que indignação, uma tristeza e quase um desânimo em todas as presentes. E também uma constatação: muitas pessoas não sabem o que é a LIGA, nem conhecem o seu trabalho. A reunião acontece uma vez por mês às 18h da primeira quarta-feira do mês. Fora isso, a Liga atende mais de setecentos pacientes no município de Sapiranga, assistindo os doentes e seus familiares. Agenda consultas, encaminha e faz exames, repassa medicação, comprada pela própria LIGA ou doada, patrocina o atendimento médico, cirurgias e o tratamento todo, sem falar nos serviços de apoio como atendimento psicológico, nutricionista, palestras de prevenção, cursos de pintura e artesanato e entrega de cestas básicas para as famílias dos doentes carentes.
Tudo isso necessita de uma estrutura, uma logística. Necessita de mão de obra, material, equipamentos, pessoas capacitadas ou apenas com boa vontade. As voluntárias se desdobram como podem para administrar e poder manter tudo isso. Mas sempre falta gente e sobra serviço. E sabem quanto elas recebem por isso? O agradecimento dos pacientes e suas famílias. Nada mais. Nem um centavo. Para todas, acredito que este reconhecimento vale muito mais do que qualquer outra coisa, inclusive dinheiro, se fosse uma atividade remunerada. Há um revezamento, é óbvio. E cada uma participa de acordo com suas possibilidades e disponibilidades. Mas tem algumas voluntárias que estão na linha de frente, comparecem diariamente e carregam o piano sozinhas, como se diz. Quando faltam recursos para medicamentos, alimentos ou para pagar as contas, lá vão elas promover um chá, um evento para angariar fundos, ou mesmo pedir colaboração a entes públicos e privados. Contam com a valiosa colaboração das entidades e clubes de serviço, que lhes destinam recursos sempre que possível. Mas o trabalho não tem fim. Quem já foi atendido ou teve um familiar seu atendido pela Liga, sabe do que estou falando. Da dedicação, do desprendimento e da esperança que as voluntárias levam a quem precisa. Há aquelas que viram a noite trabalhando em eventos, quando isso se faz necessário. As que visitam as famílias dos doentes, levando uma palavra de conforto e alguma perspectiva, as que vão aos lugares mais inóspitos esclarecendo e ensinando cuidados de prevenção, as que preparam os alimentos servidos para os doentes, as que fazem a parte administrativa, enfim...
E pensam que elas trabalham com cara de chuchu murcho? Nada disso, os semblantes são alegres, seu entusiasmo contagiante. Estão impregnadas pelo espírito comunitário, pela necessidade de se doar ao próximo. E então, o que importaria se fossem “dondocas”, ou mulheres “sem ter o que fazer”? Na verdade, não são. Grande parte das voluntárias tem seu próprio trabalho e se desvia dele para poder dedicar algum tempo para ser solidária. E todas tem sua própria família, seus afazeres. O que as move então?
A Liga Feminina de Combate ao Câncer já atua em Sapiranga há 15 anos. No dia da reunião ficamos pensando que talvez precisássemos esclarecer melhor a comunidade sobre o que é a LIGA e como funciona. É o que estamos tentando fazer, e por isso estou escrevendo essas linhas. Mas nada se compara a conhecer o trabalho “in loco”. Por isso, fica o convite: venha conhecer a LIGA, participe de suas promoções, ou apenas pergunte a alguém que já foi atendido. Mas pode ter certeza de uma coisa: se quiser encontrar alguma “dondoca”, vai se decepcionar... Lá só tem guerreiras.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

O direito de ser mãe

Apesar de lidar com questões práticas e muito concretas, sempre fui daquelas pessoas um pouco românticas. Que às vezes sonham acordadas e tudo mais. Mas um romantismo me escapou: tive medo da maternidade, um dia. Não sabia nem explicar porque, se era receio de criar um vínculo tão permanente ou medo do parto ou o que. Sei que quando me descobri grávida de minha primeira filha, chorei. E não era mais criança, tinha então 28 anos, já tinha até casado. Chorei de insegurança, de medo de como seria. Teria que interromper o trabalho, o que poderia oferecer para esta criança? Saberia ser mãe, como foi a minha mãe? E, para completar, meu pai havia partido há pouco tempo, então imaginava o quanto ele teria gostado de ter um neto, e não teve tempo de conhecer... Fiquei angustiada por um tempo, até que a ficha caiu.
Foi numa manhã, indo pro trabalho, no meu fusquinha azul, lembro muito bem... Senti, de repente (quer dizer, após alguns dias de reflexões e divagações, que eu naquele tempo já era dada a isso), o quanto de importante eu era diante da natureza, carregando uma vida dentro de mim e sendo responsável por ela. É, foi um insight, ou chamem como quiserem. O caso é que este sentimento, que talvez já existisse, mas estava mascarado pelo medo, fez com que eu me achasse uma pessoa capaz de tudo, viesse o que viesse pela frente. Que o mundo não era nada, podia acontecer qualquer coisa eu estaria, como de fato estava, feliz. Foi uma felicidade aprendida, não tenho vergonha de dizer. E o melhor ainda estava por vir. Foi quando ela nasceu. Se existe um momento em que o sonho vira realidade, esse é o momento. Alguém novo, uma nova pessoa e eu ali fazendo parte de tudo. Não existe emoção maior. Depois, tive mais dois filhos. A mesma emoção. A vida se repetindo. Maravilhosamente, se repetindo. Então, os sorrisos, as surpresas, o entusiasmo vida afora. Claro, também os sustos, preocupações, noites pouco dormidas. Mas isso são detalhes. Quando crescem, novas perspectivas trazem novas situações, novos medos e dificuldades. Também novas alegrias, conquistas, e a caminhada continua. E, de repente, passam a nos ensinar coisas. Sabem fazer o que não sabemos. Quando vejo, por exemplo, a filha do meio e o caçula tocando piano, sinto que é uma parte de mim que se realiza neles. Sei que terão suas vidas, que um dia irão bater asas, mas talvez eu possa ser seu porto para uma parada...
Nascidos do ventre ou do coração os filhos serão para sempre filhos, para todas as mães. Tem aquele poema do Gibran que diz “vossos filhos não são vossos filhos, são os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.” E a vida se repete... Maravilhosamente...

domingo, 2 de maio de 2010

Volver a Los 17

Mercedes Sosa
Composição: Violeta Parra


Volver a los diecisiete después de vivir un siglo
Es como descifrar signos sin ser sabio competente,
Volver a ser de repente tan frágil como un segundo
Volver a sentir profundo como un niño frente a Dios
Eso es lo que siento yo en este instante fecundo.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

Mi paso retrocedido cuando el de ustedes avanza
El arco de las alianzas ha penetrado en mi nido
Con todo su colorido se ha paseado por mis venas
Y hasta la dura cadena con que nos ata el destino
Es como un diamante fino que alumbra mi alma serena.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

Lo que puede el sentimiento no lo ha podido el saber
Ni el más claro proceder, ni el más ancho pensamiento
Todo lo cambia al momento cual mago condescendiente
Nos aleja dulcemente de rencores y violencias
Solo el amor con su ciencia nos vuelve tan inocentes.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

El amor es torbellino de pureza original
Hasta el feroz animal susurra su dulce trino
Detiene a los peregrinos, libera a los prisioneros,
El amor con sus esmeros al viejo lo vuelve niño
Y al malo sólo el cariño lo vuelve puro y sincero.

Se va enredando, enredando
Como en el muro la hiedra
Y va brotando, brotando
Como el musguito en la piedra
Como el musguito en la piedra, ay si, si, si.

De par en par la ventana se abrió como por encanto
Entró el amor con su manto como una tibia mañana
Al son de su bella diana hizo brotar el jazmín
Volando cual serafín al cielo le puso aretes
Mis años en diecisiete los convirtió el querubín.