domingo, 22 de novembro de 2009

REDENÇÃO

Era uma vez uma menina que tinha sonhos. Muitos... Não sabia como e se poderia realizá-los um dia. Talvez um deles fosse conquistar o mundo ou que o mundo se deixasse por ela conquistar. Sentia-se preparada e com a vontade dos que tinham certeza de tudo. E o que era o mundo, então? Enorme e cheio de fantasias. Pronto para ser bebido e absorvido, desbravado... Mas a menina foi vivendo e em suas vivências, os sonhos sendo esquecidos ou substituídos por outras necessidades, até que por fim, a menina deixou de sonhar. Deixou de fazer planos, porque a vida estava ali e tinha que ser encarada. Tinha que ser vencida. Havia esperas e expectativas e ela precisava corresponder. Precisava ser mais prática, a vida exigia. Os papéis, as funções pré estabelecidas, as etapas a serem seguidas, todos à sua espera. Quanto tempo passou, quantas vezes chorou e quantas vezes não entendeu mais nada... Quantos mecanismos e personagens acionou. Sua alma criança ainda mantinha, bem escondida, uma esperança de um dia voltar a sonhar. Mas como, se estava sozinha? Como, se o mundo estava a provar-lhe, diariamente, que sonhos eram bobagens? Que não se pode se apoiar em sonhos, precisa-se conquistar coisas concretas. Bem concretas, palpáveis, duráveis, mostráveis, prováveis. E assim, a vida seguia nos trilhos traçados para outros vagões; caminhos abertos por outros e direções que não levavam ao caminho sonhado. E a menina foi acreditando que a vida era assim. Que estava tudo programado, e a programação devia ser cumprida para tudo dar certo. Mas o que é tudo, ainda? Fazer as coisas certas deveria trazer um resultado esperado e a felicidade seria a conseqüência lógica. Mas não foi. Ao invés, o vazio, a carência, a dor não revelada. A sobrevivência perfeita, para quem olhava de fora. A vida se esvaindo com o pulsar da vida por acontecer. Eis que a menina cansou. Pensou em percorrer outras trilhas, mas agora? Cadê coragem, cadê amparos, cadê permissão? E ainda haveria tempo? Sim, haveria... De repente algo a fez despertar. Depois de tanto tempo, um tempo longo demais, a menina começou a ver a vida com um olhar diferente. Dentro dela, a semente que não morreu. A centelha que não se apagou. De repente estava na sua cabeça, no seu coração, seus braços abertos, suas mãos regeneradas e seus pés que passaram a caminhar por outras sendas. Improváveis, impalpáveis, sem garantias. Todo seu ser ressurgiu do nada. E num movimento contrário ao esperado, ousou sonhar de novo. Se colocou ao caminho desafiador do seu momento. A direção desejada, escolhida e ansiada, talvez nunca pensada. A sua direção. Não foi entendida. Estaria delirando, a menina? Ficou confusa a se questionar: é isso mesmo? “O que estou fazendo comigo?” passou a ser a pergunta que não queria mais calar. Mas o seu coração lhe dizia que estava ficando feliz. Feliz com a busca empreendida, com a oportunidade permitida a si mesma, mesmo sem saber onde irá chegar, ou se irá chegar. Não saberá, não precisa saber, ainda. Basta realizar o movimento em perfeita harmonia com a essência buscada. Não há um final previsível, mas apenas desejado, buscado, possível. E haverá final, afinal? Se houver, será construído e será verdadeiro, coerente com suas possibilidades. Suas e não de outros... Os sonhos são isso: também fazem acontecer o real, o legítimo, porque fruto do próprio descobrimento, do conhecimento que se encontra na profunda essência da alma, tantas vezes subjugada e desconectada do verdadeiro sabor da vida...
Iara Magajewski Averbeck

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