sábado, 23 de abril de 2011

Os sinos dobram por nós

Transcrevo dois textos que li em diferentes momentos e que apresentam duas realidades. Encontrei-os, recortados e bem guardados, e quando os li novamente, com o olhar amadurecido pelo tempo, percebi o quanto tinham em comum, na medida em que tratam da solidão humana sob ângulos opostos, mas nem por isso impossível de encontrar entre eles um elo que nos faça refletir sobre a nossa natureza humana.
Primeiro texto: “Vivemos, agimos e reagimos uns com os outros; mas sempre e sob quaisquer circunstâncias, existimos a sós. Os mártires penetram na arena de mãos dadas; mas são crucificados sozinhos. Abraçados, os amantes buscam desesperadamente fundir seus êxtases isolados em uma única auto transcendência; debalde. Por sua própria natureza, cada espírito, em sua prisão corpórea, está condenado a sofrer e gozar em solidão. Sensações, sentimentos, concepções, fantasias – tudo isso são coisas privadas e, a não ser através de símbolos, e indiretamente, não podem ser transmitidas.” (Aldous Huxley, em As portas da percepção e céu e inferno).
Segundo texto: “Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra. Se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso, não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti.” (John Donne, no livro Por Quem os Sinos Dobram).
E daí que: Já dizia o poeta Mário Quintana, “viajar é mudar o cenário da solidão”. E é. Nascemos sós e morremos sós. No meio disso nos iludimos de que estamos acompanhados. De fato, podemos até estar, mas isso não nos retira da solidão. O único diálogo verdadeiro é aquele que temos com o nosso eu. As maiores batalhas que travamos são interiores. Das janelas da alma, vemos tudo e tudo percebemos. E a partir daí, interagimos. Então, trocamos solidões. E ao trocar solidões encontramos o nosso semelhante. No semelhante vislumbramos nossa própria vida e descobrimos o quanto estamos interligados pelo simples fato de existirmos. E que cada ato nosso, ação ou reação vem a influenciar quem está ao nosso lado. Influenciando, somos responsáveis...

Deus existe no jornalismo

Sabem o horário de verão? Aquele que quando inicia você adianta o relógio e quanda termina você atrasa o mesmo relógio? Pois é. Em outubro, quando começou o horário de verão, toda a mídia noticiou e, nós do Jornal A Opinião também. Por isso, nada mais justo que, em fevereiro fazer menção ao término do mesmo. E coube a mim, na qualidade de estagiária, fazer o texto, curto, mas informativo. E foi o que fiz: bem suscinto, anunciando o término do horário de verão à meia noite do sábado que se seguia àquela edição do jornal. Inclusive antes de sair, vi o Jorge, nosso diagramador nota 10, colocar um reloginho estilizado para ilustrar. No dia seguinte, sexta-feira, de manhã quando o nosso jornal já devia estar saindo da prensa, ao assistir o telejornal matinal, ouvi a apresentadora dizendo: “termina amanhã o horário de verão; atrase seu relógio em uma hora”. Quase enfartei. Ela disse “atrase” e eu havia colocado “adiante seu relógio em uma hora”. Quis morrer, fugir, viajar para qualquer lugar do mundo onde não houvesse horário de verão. Imaginem que gafe na primeira página do jornal (ou era na segunda, já nem lembrava), que fiasco! Logo naquela edição que estava tão boa. E logo na semana que eu havia discutido sobre o assunto “correção de textos” com uma amiga, afirmando-lhe, garantindo-lhe que corrigíamos tudo, que cuidávamos muito para não ter erros. Bem feito pra mim. Quem manda não questionar as certezas (eu nunca tivera dúvidas quanto aos respectivos adiantar/atrasar, foi a hora da bobeira)... Liguei pro Martins, o diretor do jornal, relatando o ocorrido, na esperança de que após a minha saída, alguém tivesse visto e corrigido o erro, ao que ele tranquilamente me respondeu: “te confesso que não reparei... Mas não esquenta!” Ai! Isso queria dizer que o “adiante seu relógio” estaria lá. E como não esquentar? Paciência, o que não tem remédio, remediado está, pensei, já antevendo que meu futuro jornalístico estava comprometido. Quando o jornal chegou, perto do meio dia, encontrei o distribuidor Paulo e quase arranquei um exemplar de suas mãos, enquanto lhe contava o motivo da minha aflição. Mas, pasmem, não tinha nada. Nem “adiante”, nem “atrase” e nem relógio. Folhei todo o jornal, em busca do que me faria desaparecer de vergonha, e não encontrei. Explicação lógica: depois que eu saí da redação, entrou uma matéria de últissima hora e como não havia mais espaço, simplesmente substituíram o “informativo” do horário de verão, pela bendita notícia. Explicação ilógica, talvez surreal, mas verdadeira: o meu Anjo da Guarda estava mais atento do que eu e providenciou a correção de uma forma radical, mas coerente: antes não sair nada, do que sair errado. E eu, me dei conta de duas coisas: uma, que errar é humano. A gente erra sim, por mais que se queira acertar, às vezes acontece e isso serve para que aprendamos... E a outra, apenas confirmei: que Deus existe, também no jornalismo, e às vezes nos tira do sufoco. E, pelas vezes que não tira, nos resta apenas pedir desculpas pela falha.

domingo, 3 de abril de 2011

Minha teoria sobre novelas

Porque nos envolvemos tanto? Baseando-me na observação e no sentimento, percebo que ao assistir novelas temos a ilusão de que alguém poderia escrever um enredo com final feliz só para nós... Comparamos situações e sempre encontramos alguém parecido com alguém que conhecemos ou conosco mesmo, alguma coisa semelhante com algo que já nos aconteceu, algum personagem que nos lembra de alguém... Jurei várias vezes que não iria mais assistir novelas. (Agora, até estou cumprindo.) Só que quando via, lá estava eu, me identificando com algum personagem e isso me levava a assistir só mais um capítulo e assim ia até o último. É uma sensação de poder comparar e definir comportamentos, ou acompanhar o desfecho de uma história que, talvez, pudesse ser a nossa. Uma fantasia que nos faz esperar uma resposta, uma sugestão para nossa própria vida... Quem sabe se eu agir assim, o resultado será aquele da novela também? Perdoem-me, mas mesmo com todo esse estardalhaço em torno dos folhetins, quem escreve novela, entende pelo menos um pouco da natureza humana e sabe como sensibilizar as pessoas. Estuda comportamentos e posicionamentos. A diferença é que nas novelas tem uma única mente, uma única inteligência, dirigindo tudo, mudando o destino dos personagens a seu bel prazer. Ou ao sabor da audiência, o que é mais provável. Assim, se um comportamento desagrada o público, é fácil mudar. Basta reescrever o capítulo e mudar o rumo da história. Na vida não é assim. Quantas vezes enfrentamos situações difíceis de conduzir, onde não basta apenas a vontade de uma das partes envolvidas para solucionar o problema. Quantas vezes temos a chance de “reescrever” o que vivemos? A vida real muitas vezes apresenta apenas uma hipótese, sobre a qual devemos nos adaptar ou buscar outro caminho. Pressupõe um acordo de vontades, ou se não há acordo, pode ocorrer um rumo não desejado à história. Porém, sempre muito mais do que uma simples mudança de roteiro de uma hora para outra. Atente-se para o fato de que as novelas instigam, muitas vezes, ou pelo menos mostram como normais alguns comportamentos que são completamente contrários a nossos princípios, mas que assim vistos na telinha podem parecer triviais e até desejáveis. Acredito que, se tivéssemos oportunidade de viver algumas histórias contadas nas novelas, nos daríamos conta de que nossas vidas reais tem muito mais emoção e mais situações interessantes do que todo o espetáculo feito para nos distrair de nossos verdadeiros sentimentos e convicções.